Restinga como APP: uma mudança relevante no entendimento jurídico ambiental

STJ decide que a vegetação de restinga só será considerada Área de Preservação Permanente quando exercer função ecológica específica, redefinindo critérios para licenciamento ambiental e segurança jurídica em áreas costeiras.

Por: Redação

A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou entendimento determinante: a vegetação de restinga só poderá ser classificada como Área de Preservação Permanente (APP) quando demonstrar função ecológica específica — como fixação de dunas ou estabilização de mangues — ou estiver situada em faixa de até 300 metros da linha de preamar máxima.

Isso marca uma limitação frente ao pleito inicial do Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC), que buscava o reconhecimento automático de qualquer área de restinga como APP, independentemente de sua função ou localização.

Bases da decisão

  • O julgamento partiu de recurso especial movido pelo MP/SC contra o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA/SC), referente à concessão de licenças ambientais em áreas de vegetação de restinga.

  • A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, destacou que o artigo 4º, inciso VI da Lei 12.651/2012 (Código Florestal) e o artigo 3º, inciso IX da Resolução 303/2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) já estabelecem critérios claros para definição de restinga como APP.

  • O tribunal entendeu que estender a proteção indiscriminadamente — isto é, todas as áreas de restinga como APP — implicaria em função normativa que cabe ao legislador, e não ao poder judiciário ou à administração pública.

Implicações práticas para o mercado, empreendimentos e meio ambiente

Para empreendimentos imobiliários e de infraestrutura costeira:

  • A decisão reduz parte da insegurança jurídica: licenciamento em áreas de restinga que não cumpram a função ecológica específica agora possui menor risco de serem automaticamente tratadas como APP.

  • Ainda assim, permanece a necessidade de análise rigorosa do local — sendo essencial verificar se a vegetação exerce função como estabilização de mangues ou fixação de dunas ou se está na faixa de 300 m da linha de preamar máxima.

  • As empresas devem reforçar a realização de estudos ambientais detalhados e buscar pareceres técnicos que atestem a função ecológica daquela vegetação de restinga, de modo a preparar a documentação para licenciamento e eventual defesa.

Para órgãos públicos e de meio ambiente:

  • O entendimento exige que esses órgãos ajustem suas práticas de licenciamento, fiscalização e condicionantes ambientais, considerando a função ecológica como critério-chave para reconhecimento de APP em área de restinga.

  • Em processos de regularização ou concessão de licenças ambientais, os pedidos de reconhecimento automático de restinga como APP sem observar os critérios poderão ser objeto de impugnação ou contestações jurídicas.

Para o meio ambiente e segmentos de conservação:

  • Embora o julgamento possa ser visto como uma limitação da proteção automática, ele também reforça que as áreas que de fato cumpram função ecológica específica continuam plenamente protegidas.

  • Ressalta-se a importância de que a vegetação de restinga que não seja tratada como APP ainda encontra outros níveis de tutela — por exemplo, via a Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006) ou outras normas ambientais correlatas — o que evita a percepção de “terra de ninguém”.

Recomendações para atuação estratégica

Para consultoria jurídica, contencioso ou assessoria ambiental, especialmente em empreendimentos costeiros, destacamos os seguintes passos de ação:

  1. Realizar diagnóstico ambiental preciso: identificar se a área de restinga exerce função de estabilização de dunas ou mangues ou se está na faixa de 300 m da linha de preamar máxima.

  2. Avaliar contratos, licenças e condicionantes ambientais com base no novo entendimento, revisando cláusulas que pressupõem automaticamente o regime de APP para vegetação de restinga.

  3. Monitorar pareceres técnicos e laudos ambientais que comprovem ou não a função ecológica da restinga — estes servirão como prova de apoio em licenciamento ou contencioso.

  4. Verificar a existência de legislação estadual ou municipal que possa ampliar ou reduzir os critérios de proteção — em alguns casos a norma local pode trazer maior rigidez, o que exigirá conformidade.

  5. Para instituições financeiras ou investidores, avaliar o risco jurídico e ambiental de empreendimentos em área de restinga como parte da due diligence, considerando o novo entendimento do STJ como fator mitigador de incerteza.

Conclusão

O julgamento da 2ª Turma do STJ representa um marco relevante para o direito ambiental brasileiro, especialmente no que toca à definição de APP em vegetação de restinga. Ao condicionar tal classificação à função ecológica específica ou à localização em faixa costeira de até 300 m, a decisão oferece maior previsibilidade jurídica para empreendimentos, ao mesmo tempo em que mantém proteção eficaz às porções costeiras mais sensíveis.

No escritório CAVALCANTI Advogados Associados, estamos preparados para prestar assessoria estratégica a empreendedores, órgãos ambientais e investidores na interpretação desse entendimento e na adaptação de práticas de licenciamento, contratos e gestão de riscos ambientais.