Constituição completa 37 anos e ainda sofre com omissões legislativas reconhecidas pelo STF

Mesmo passadas quase quatro décadas desde sua promulgação, vários dispositivos constitucionais permanecem sem regulamentação, o que exige ação decisiva do Poder Legislativo — e, em casos extremos, atuação do Supremo para forçar sua aplicação plena.

Por Redação

No dia 5 de outubro de 2025, a Constituição Federal de 1988 comemora 37 anos desde sua promulgação — símbolo do processo de redemocratização e marco da proteção de direitos fundamentais. No entanto, essa efeméride não pode ser celebrada apenas com júbilo: muitos dos direitos lá previstos ainda dependem de leis regulamentadoras para serem efetivamente aplicados.

É papel do Congresso Nacional legislar para viabilizar esses dispositivos, mas a morosidade e a inércia legislativa tornaram inevitável a intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao longo dos anos, tem sido provocado a reconhecer tais omissões e a fixar prazos para que o Legislativo corrija deficiências constitucionais.

Principais omissões reconhecidas pelo STF

Ao longo dos últimos anos, o STF tem marcado posição em casos emblemáticos nos quais apontou falhas do Congresso em atender preceitos constitucionais:

  1. Número de deputados federais
    A ADO 38 questionou a ausência de lei complementar que definisse critérios atualizados para distribuição das cadeiras da Câmara dos Deputados, conforme exige o § 1º do art. 45 da CF. Em agosto de 2023, o STF reconheceu essa omissão e concedeu prazo para a sua apreciação legislativa.
    A resposta do Congresso foi parcial — aprovou-se o PLP 177/23 para ampliar e redistribuir cadeiras, mas o presidente vetou o texto integralmente.
    Diante do impasse, o STF, por medida cautelar, determinou que o número de deputados em 2026 permaneça o mesmo de 2022, até que haja nova definição clara e segura.

  2. Participação de trabalhadores na gestão das empresas
    O inciso XI do art. 7º da Constituição prevê que os trabalhadores participem, excepcionalmente, da gestão das empresas por lei. Em 2025, ao julgar a ADO 85, o STF reconheceu que essa parte da norma permanece sem regulamentação, fixando prazo de 24 meses para que o Legislativo edite a norma correspondente.

  3. Retenção dolosa de salários
    Embora o art. 7º da Constituição preveja que a retenção intencional de remuneração constitui crime, o Congresso jamais tipificou esse delito. Na ADO 82, em 2025, o STF considerou essa falha legislativa e impôs prazo de 180 dias para que seja aprovada a lei penal correspondente.

  4. Proteção legal ao Pantanal
    Na ADO 63, em 2024, o STF apontou omissão na edição de lei federal específica para o bioma Pantanal, atribuindo prazo de 18 meses ao Congresso para suprir essa lacuna ambiental. Caso não haja deliberação, o Tribunal poderá adotar medidas supletivas.

  5. Licença-paternidade
    A Constituição assegura, no art. 7º, a licença-paternidade, mas a regra vigente continua limitada ao prazo transitório de cinco dias previsto no ADCT. Em 2023, na ADO 20, o STF reconheceu essa deficiência regulatória e estabeleceu prazo de 18 meses para que seja aprovada lei específica.

  6. Adicional por atividades penosas
    Previsto no inciso XXIII do art. 7º, o adicional para atividades penosas carece de regulamentação para trabalhadores urbanos e rurais. Em 2024, o STF, na ADO 74, reconheceu a omissão e fixou prazo de 18 meses para aprovar norma regulamentadora.

O papel do STF: medidor, guardião e induzidor

A jurisprudência constitucional consolidou uma prática: quando o Executivo e o Legislativo permanecem inertes, o STF não se limita à constatação formal da omissão, mas adota medidas para pressionar sua superação. Entre essas medidas, destacam-se:

  • Fixação de prazos razoáveis: para que o Congresso legisle antes que a norma constitucional se torne letra morta.

  • Medidas supletivas ou substitutivas: quando houver omissão persistente, o STF pode estabelecer mecanismos para assegurar a eficácia do direito, até que a lei definitiva venha.

  • Controle de constitucionalidade associado: reconhecer omissão não é usurpar função legislativa, mas assegurar que o princípio da supremacia da Constituição não seja vilipendiado.


Entretanto, o STF evita invadir a seara do Legislativo, procurand manter o equilíbrio institucional e respeitar a separação dos Poderes. Sua intervenção costuma ter caráter excepcional, apenas após reiteradas cobranças ou omissões prolongadas.

Reflexos práticos e desafios

A ausência de regulamentação prejudica concretamente cidadãos e entes públicos:

  • Direitos não exercidos: servidores, trabalhadores e cidadãos ficam sem meios efetivos de reivindicar direitos assegurados constitucionalmente.

  • Insegurança jurídica: a indefinição normativa dificulta sua aplicação uniforme e gera litígios.

  • Impactos sociais e ambientais: lacunas regulatórias em temas como proteção ambiental ou garantias trabalhistas têm consequências práticas, muitas vezes graves.


Do ponto de vista institucional, essa realidade revela uma falha de funcionalidade democrática: não basta ter direitos garantidos em texto, é necessário que o Estado legisle e implemente estruturas que os tornem reais.

Conclusão e convite à reflexão

Ao completar 37 anos, a Constituição de 1988 permanece viva e essencial, mas sua eficácia plena depende da superação das omissões legislativas que persistem. O STF tem atuado como instância corretiva e catalisadora dessa evolução normativa, mas cabe ao Congresso Nacional cumprir seu papel constitucional com mais diligência e responsabilidade.

Na prática, para escritórios, empresas e cidadãos, acompanhar esses temas não é mera curiosidade acadêmica — é imperativo para planejar estratégias jurídicas, avaliar riscos e reivindicar direitos.